Não consegui falar de futebol neste fim de semana. Para quem não sabe, meu avô Venusino faleceu na sexta-feira, dia 1º de novembro. Ele vinha lutando contra a Hepatite C, contraída ainda dos tempos em que atuou como goleiro de futebol, dividindo as inúmeras seringas que circulavam nos vestiários. Era goleiro. Eu também quis ser quando pequeno, inspirado nos álbuns de fotos que folheava na casa dele. E assim, como goleiro, ele se despediu. Fardado com o uniforme de passeio e coberto com a bandeira do Grêmio Bagé - clube que defendeu pela maior parte da carreira, na década de 60. Ainda passou por 14 de Julho de Livramento e Gabrielense de São Gabriel. Mas entrou para a história como camisa 1 do Jalde-Negro. Pelo menos foi isso o que contou o jornal da cidade no dia seguinte e o que ouvi de um senhor desconhecido na porta da capela do cemitério municipal.
Estava eu enxugando as lágrimas quando este senhor (já de certa idade) me interpelou: "Quem é que está sendo velado?". Atônito com a falta de sensibilidade, respondi ríspido: "É o meu avô!". Ele insistiu: "Teu avô era o Venusinso, o goleiro?". Acenei com a cabeça que sim. "Bah, eu odiava ele! Sempre pegou muito contra o meu Guarany", comentou o velhinho antes de me deixar. Em seguida vi adentrar o salão um antigo companheiro de meu vô, Joaquim, ex-meia do Bagé. Amargou aqueles maus tempos do time, que via o rival subir à Primeira Divisão Gaúcha e acabou saindo antes de Juarez Tanque, ex-Grêmio, vestir o manto jalde-negro em 1965. Meu avô continuou. Não era o reencontro ideal. Mas foi uma despedida honrosa.
Certamente, Venusino não foi o melhor goleiro do Bagé. Mas foi o melhor goleiro que eu não vi jogar. É como devem se sentir os colorados e gremistas, meus contemporâneos, que admiram Manga ou Eurico Lara só pelas histórias que ouvem, sem nunca tê-los visto em campo. Eram e sempre serão ídolos. A diferença é que para mim o ídolo esteve sempre ali, fazendo o leite com banana no final do dia, debatendo futebol de manhã cedo, me recebendo para abrir a porta quando eu chegava de festa na madrugada. Fomos amigos íntimos - nada que impedisse um puxão de orelha inesquecível num Natal. Foi meu companheiro de café, almoço, churrasco, janta e até da gemada antes de dormir. E eu nunca imaginei que ele iria embora. Era como se fosse o meu super-herói. Mas ele foi. Foi embora, mas não deixou de ser o super-homem que eu sempre imaginei. Obrigado, Venusino - o goleiro.
Um comentário:
Que lindo !Ler um depoimento destes nos dias de hoje onde os jovens não respeitam os mais velhos , a gente lê e sente como tu amava teu avô.
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